O excesso de atividades e a falta de tempo para brincar
e fantasiar pode ser prejudicial às crianças.
 
No dia-a-dia moderno, até as crianças andam cheias de compromissos: natação, informática, inglês, balé, futebol, judô, piano... Ufa! Será que tudo isso é necessário? "Este é um dos maiores enganos educacionais da modernidade", adverte a psicanalista Célia Terra, professora da PUC-SP. A ironia é que os pais sobrecarregam as crianças, geralmente pensando em proporcionar-Ihes uma carreira promissora no futuro, mas acabam prejudicando a criatividade dos baixinhos, uma das qualidades mais requisitadas nos novos profissionais.
As crianças que têm muitas aulas levam uma vida super-regrada, sempre submetidas às normas do aprendizado, não importa sua idade ou inclinação. Como não dispõem de tempo para fantasiar e ficarem a sós consigo mesmas, tendem a se tornar menos criativas. Explica-se. Ter tempo para brincar é fundamental, pois é assim que o baixinho constrói sua individualidade e se relaciona com o mundo. Mesmo quando chega a idade de aprender idéias abstratas, aos 7 anos, a imaginação continua sendo um elemento importante da psique humana. O estresse é outro resultado do excesso de atividades, deixando as crianças mais agitadas. O estímulo exagerado gera ainda um resultado oposto: a desmotivação. Com tantas obrigações, ele não se envolve nas atividades, que dirá divertir-se. Este fator, aliado ao cansaço, pode levar a um baixo rendimento nos cursos e a um grande desperdício para os pais tão zelosos do futuro.
A saída é p equilíbrio. Por exemplo, matricule-o num curso intelectual. como inglês ou informática, se você considerar que estas habilidades são importantes para a formação do seu filho, e deixe que ele escolha o esporte de sua preferência, sem interferir muito.
Quando a criança é filha única, é comum os pais desejarem preencher todos os horários vagos do pequeno, pois ele fica aborrecido por não ter o que fazer, nem com quem brincar. Uma forma de contornar a situação é fazer com que ele visite um amiguinho ou primo. Vocês também podem convidar um coleguinha da escola ou
do bairro para brincar em casa. Assim, você estimula a sua sociabilidade, sem falar que ele vai adorar compartilhar estes momentos.
Outro programa é levá-lo para assistir a uma peça ou filme infantil, a uma exposição de artes plásticas (alguns museus têm até oficinas para crianças) ou a uma daquelas livrarias com espaço para a garotada ler e brincar. É um jeito divertido de proporcionar conhecimento e desenvolver o gosto pela leitura e pelas artes. É um lazer sem a obrigatoriedade e as regras rígidas de um curso. Se o objetivo é fazer o pequeno "malhar", nada como um passeio ao clube ou ao parque para exercitar os músculos.
É natural querer uma vida de sucesso para nossos filhos, mas a ansiedade em desenvolver suas possibilidades pode sobrecarregá-los. Também há o risco de tentar se realizar através deles. Se você foi uma exímia pianista e sua filha não suporta Beethoven, não se frustre, nem a matricule numa escola para aprender piano. Com bom senso e compreensão, você saberá selecionar as atividades importantes para o desenvolvimento da criança.
(Fonte: Revista "Mãe, você e seu filho", edição 58)
 
 
 
 
 
 
 
POR QUE ELE É POBRE?
"Seu filho já percebe a existência de problemas sociais.
Nessa idade, ele pode e deve saber se defender da violência urbana"
 
Foi-se o tempo em que até as crianças das grandes metrópoles brincavam despreocupadas pelas ruas. Jogavam bola, andavam de bicicleta. Hoje nossos filhos vivem cercados em apartamentos e condomínios, cheios de vigilantes e de recomendações, mas estas "ilhas de segurança" não os impedem de entrar em contato com a violência urbana ou de serem abordados por crianças de rua que cobiçam o seu tênis importado ou o seu relógio supertransado.
O conflito é inevitável. Nossos filhos sentem um misto de medo e de repulsa pelas crianças que vivem nas ruas, que pedem dinheiro nos faróis. Para lidar com uma situação tão incômoda, neste momento, os pais precisam ser uma espécie de "sociólogos". É necessário explicar aos filhos porque a miséria existe e o que leva o menor abandonado a roubar e até mesmo a matar. Como fazer? "Antes de mais nada é importante retratar estas crianças não como pessoas totalmente malvadas e sim como indivíduos que não tiveram as mesmas oportunidades dos que possuem uma família com melhor condição financeira", recomenda a psicanalista Célia Terra, professora da Faculdade de Psicologia da PUC (SP).
Explique que os meninos de rua não vivem com suas famílias, que elas são miseráveis e não têm condições de cuidar deles, de lhes dar uma boa escola, uma casa aconchegante com comida quentinha e roupa lavada. Desamparados e assustados, eles começam a agredir as outras pessoas e a roubar para buscar aquilo que não lhes foi dado. Difícil para o pequeno entender? Nem tanto. Nesta faixa etária, eles começam a perceber a realidade e se voltam para o mundo externo para aprender a conviver com outras pessoas, além da família e da escola. É quando aprendem as normas sociais e preocupam-se com as regras. É por isso que as crianças desta idade gostam tanto de jogos.
Nâo foi por acaso que as escolas começaram a ensinar noções de cidadania a partir do 1º grau, abordando temas como a ética. Nesta fase, os pequenos também vivem um processo chamado elos sicólogos de "romance familiar" e criam a fantasia de que não são filhos de seus pais. "Ao se depararem com o menor de rua, eles se assustam, imaginando o que aconteceria se não tivessem uma família", explica Célia Terra.
Compreensão e solidariedade à parte, não se esqueça de ensinar as crianças a se defenderem nesta "selva de pedra" em que se transformaram as grandes cidades. Afinal, os menores de rua assaltam mesmo. Algumas recomendações importantes são: não ostentar objetos que provoquem cobiça, como o tênis de grife; se suspeitar da intenção de assalto, procurar um adulto, de preferência um policial ou segurança e, no caso de ser assaltado, não reagir.
Infelizmente a violência urbana existe e não podemos escondê-la das crianças. Explicando a realidade e ensinando noçôes de cidadania, quem sabe a próxima geração não consegue construir uma realidade melhor?
 
(Fonte: Revista "Mãe, você e seu filho", edição 56)

 

 

 

COMER, FALAR E VIVER
"Uma refeição em família pode valer bem mais que um bifinho:
pode ser o início de uma boa relação entre pais e filhos"
 
Segundo a psicóloga Cristina Magnaghi, não é à toa que cineastas como Ettore Scola (em A Família) e Ang Lee (Comer, beber, viver) já usaram a mesa como cenário para os complexos processos que envolvem pais e filhos. "A refeição é um lugar privilegiado onde a alquimia feita no fogão chega à mesa: a partir das experiências individuais partilhadas surgem sentimentos profundos, que alicerçam um diálogo duradouro", diz a profissional.
Mas, por volta dos 7 anos, quando começa a carreira escolar oficial, a criança começa a sofrer as pressões da vida moderna, com pouco tempo para as refeições, e a conversa entre pais e filhos vai minguando. O que se perde na correria? A oportunidade de dividir suas experiências em família.
Quando a TV está desligada e nos reunimos em torno da refeição, é possível ver e ouvir o outro. Os pais têm a oportunidade de prestar atenção às crianças e dar-lhes as respostas que precisam para crescer. No meio do caminho, todos constróem um diálogo profundo e duradouro, enquanto os pequenos descobrem que todos têm medos e felicidades.
Tudo fica ainda mais apetitoso quando a família tem um modelo em que as regras não são impostas, mas explicadas, todos são iguais e, principalmente, respeitados. Porém, cuidado com as palavras. Não confunda respeito com autoritarismo. Enquanto eles, lentamente, vão percebendo que são aceitos e têm suas necessidades reconhecidas (são respeitados), aprendem a noção saudável de autoridade. Ou seja, têm limites e respeitam as regras do jogo e cobram os pais, caso eles não as cumpram. Nesta família, quando as crianças ficam doentes, sem apetite, podem escolher tomar um copo de leite em vez de comer o que está na mesa.
 
Buscando soluções: Nem tão difícil de falar, nem tão difícil de fazer. Algumas mães resolvem o problema estabelecendo horários. A secretária Eliana, separada, mãe de Giovana e Mariana, espera terminar o programa de TV Castelo Rá-Tim-Bum para servir o jantar. "É o melhor momento para educar. Eu cobro o comportamento, conversamos. O relacionamento melhorou muito depois que consegui instituir o jantar em família", conta.
O único jeito de superar os problemas é enfrentá-los. Com boa vontade, dá para driblar os desafios da vida moderna. Caso você não consiga negociar um espaço como Eliana, aproveite o fim de semana para desligar a TV e saborear uma refeição em família - com suas risadas, brigas e conversas.
Além de observar melhor seus filhos, os pais descobrem seus sentimentos em relação a eles. E podem avaliar suas dificuldades, criando bases para o diálogo, tão importante na adolescência.
 
(Fonte: Revista "Mãe, você e seu filho", edição 28)